Com quase 25 anos de existência, "Castlevania" é uma das franquias mais tradicionais dos videogames. Sua origem remete a 1986, quando o primeiro game foi lançado para o Famicom (como se chama o NES no Japão) em 26 de setembro de 1986, e depois foi convertido para várias plataformas. Tendo como tema o horror gótico, a franquia mudou de estilo ao longo dos anos: a transformação que mais deu popularidade à série iniciou-se com "Symphony of the Night", introduzindo a fase "metroidvania", com fórmula inspirada em um clássico da Nintendo, "Metroid".
"Castlevania: Lords of Shadow" retoma elementos dos primeiro game, com gráficos e uma visão de mundo mais sérios, mas é um game que levanta muitas questões. Afinal, quais características definem um "Castlevania"? Basta ter o nome da série no título ou um personagem chamado Belmont? Possuir elementos de horror e inimigos como lobisomens e vampiros? "Lords of Shadow" se inspira claramente em games diversos como "God of War" (é a referência mais óbvia), "Uncharted", "Shadow of the Colossus" e até "Resident Evil", mas a ligação com outros "Castlevania" é, no máximo, sutil.
Deixando essas questões gamer-filosóficas de lado, e se o que importa é a qualidade da obra, então, nesse quesito, "Lords of Shadow" é de fato um jogão. Não apenas em termos de tecnologia e arte, mas também de volume de conteúdo: é um título de ação e plataforma em 3D bem extenso (e intenso em vários momentos), com 15 a 20 horas de aventura sem replay (existem desafios complementares e itens escondidos que convidam novas visitas às fases, o que eleva ainda mais a vida útil do game).
Um dos aspectos que mais chama a atenção são os combates, que emula o estilo de "God of War". Gabriel Belmont, o protagonista deste "Castlevania", manipula um chicote de um jeito similar às Blades of Fury do espartano Kratos, e enfrenta horríveis criaturas com violência. Mas a brutalidade é bem mais leve que a do game com o deus da guerra: aliás, a Mercury Steam, estúdio espanhol que fez o game, até se conteve para um título não recomendado para menores de 17 anos nos Estados Unidos (talvez tenha sido ajustado para que, no Japão, não receba o temido selo Z, para maiores de 18 anos).
Existe um equilíbrio bom entre o dinamismo e a estratégia nos combates de "Lords of Shadow": nas dificuldades mais elevadas, não adianta amassar botões, principalmente quando aparecem inimigos maiores, que não são atordoados por golpes mais fracos, típicos de ataques de cobertura ampla (os pequenininhos geralmente caem como moscas). Assim, se faz necessária a utilização de várias técnicas, como os diversos golpes e combos, a defesa (ou a repulsa, para quem domina o movimento) e a esquiva - além das magias, armas secundárias e armaduras especiais, que aparecem mais pra frente.
As magias são de dois tipos - a da luz, que faz os golpes recuperarem a energia do personagem, e a da treva, que aumenta os danos e o "stopping power" - e usam uma energia especial, fornecido pelos inimigos mortos (como no "Ninja Gaiden" moderno). As armas secundárias - olha uma característica tradicional de "Castlevania" - estão potentes: a faca, por exemplo, mata os inimigos menores com apenas um tiro (e olha que ainda existe a versão explosiva desta), e o cristal, com uma apresentação épica digna de um "summon" de "Final Fantasy", praticamente pulveriza todos os oponentes que estiverem na tela. Obviamente, essas armas são relativamente limitadas.
Todos esses recursos podem parecer até supérfluos nos combates comuns, mas são, geralmente, muito úteis contra os chefes de fases que não os titãs. Esses possuem ataques fortes e com certa dificuldade para serem desviados durante a dinâmica do combate, o que requer estratégias bem definidas e, muitas vezes, todo tipo de ajuda (aí que entram todas essas magias e armas secundárias), para o sucesso da missão. Com quatro níveis de dificuldade, há desafio para iniciados e até experts ("Castlevania" só não é um jogo casual; longe disso).
O segredo de "Lords of Shadow" é saber dosar combate com exploração e quebra-cabeças num bom ritmo. Os momentos de maior intensidade, durante as lutas, são intercalados com partes em que o jogador procura por itens e resolve enigmas. As soluções não são difíceis, mas exigem alguma dose de pensamento analítico, e se o jogador não conseguir visualizar uma saída, há uma opção que libera a resposta na hora (afinal, ninguém gosta de ficar empacado). A penalidade é apenas não receber pontos que servem para liberar novos movimentos (no entanto, os inimigos também fornecem pontos). Além disso, há chefes enormes intitulados de titãs, cuja mecânica de jogo vem diretamente do cult "Shadow of the Colossus". Ou seja, o jogador tem que descobrir um jeito de escalar o corpo desse inimigo colossal, e destruir os pontos fracos. Essa é uma atração à parte no game.
O jogo é dividido em 12 capítulos e cada um deles possui diversas fases - não se trata de um mapa único como "God of War". As fases são basicamente lineares, mas existem bifurcações e áreas escondidas, onde se podem encontrar vários itens secretos. O fato de poder repetir as fases ajuda os novatos, já que podem se dedicar a procurar objetos que ajudem a melhorar o personagem e ganhar mais dinheiro, liberado mais golpes. Além disso, uma vez vencida, cada um dos estágios libera um desafio extra: o replay impõe condições, como derrotar um número "x" de oponentes, não usar magias ou termina dentro de um tempo determinado.
Há que se destacar o incrível visual. O game tem florestas, ruínas de cidades antigas, cavernas e lagos congelados reproduzidos nos mínimos detalhes, com um impressionante trabalho na representação de clima. Desde a fase de tutorial, a Mercury Steam já mostra a que veio: é uma chuva torrencial em que se vê cada gota respingar no chão e molhar a armadura, pele e cabelo de Gabriel. O trabalho de luz de sombra também é um espetáculo, com feixes sendo formados pelas folhas das árvores e, quando se olha para um inimigo contra o Sol, a claridade é tão forte que "invade" o contorno do objeto. A trilha sonora é eficiente: uma trilha sonora dramática típica dos filmes de ação e aventura.